Desmedidos momentos e cenas fabuladoras de aparição em Jacques Rancière
Ângela Cristina Salgueiro Marques
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Belo Horizonte (MG)
SALGUEIRO MARQUES, Ângela Cristina. “Desmedidos momentos e cenas fabuladoras de aparição em Jacques Rancière”. Viso: Cadernos de estética aplicada, v. 16, n° 30 (jan-jun/2022), p. 106-143.
Aprovado: 25/07/2022 · Publicado: 28/08/2022
Desmedidos momentos e cenas fabuladoras de aparição em Jacques Rancière

Este texto realiza uma revisão de literatura em torno dos principais aspectos que envolvem a construção da cena em Jacques Rancière, evidenciando como a potência fabulativa da racionalidade ficcional produz momentos quaisquer que perturbam os encadeamentos consensuais de ações, gestos, existências e experiências. A partir da produção de intervalos e liminaridades, é possível reconfigurar temporalidades e espacialidades a fim de desestabilizar e desierarquizar as relações de dominação e propor outros imaginários. O momento qualquer suspende a ordem corriqueira do tempo, redispõe o visível, as ações e as formas como as coisas e os seres aparecem, a maneira habitual de ocupar um espaço, a forma de identificar-se como indivíduo e de inscrever-se nas relações. Assim, a cena, tomada como singularidade e como operação de dissensuação a partir da qual se pode produzir momentos de rêverie (devaneio fabulador) que fraturam imaginários consensuais, altera o modo como lemos, vemos e ouvimos o outro e o mundo a nosso redor. Argumentamos que a cena realiza uma desmontagem das explicações previsíveis, deslocando consensos e oferecendo um imaginário antihierárquico e no qual coexistem múltiplos tempos, espaços e existências.

Palavras-chave:
cena; aparição; fabulação; momento qualquer
Unmeasured Moments and Fabulative Scenes of Apparition in Jacques Rancière

The aim of this text is to present a literature review around the main aspects that involve the construction of the dissent scene in Jacques Rancière, showing how the fabulative power of fictional rationality produces random moments that disturb the consensual chains of actions, gestures, existences and experiences. From the production of intervals and liminalities, it is possible to reconfigure temporalities and spatialities in order to destabilize and de-hierarchize the relations of domination and propose other imaginaries. The random moment suspends the ordinary order of time, rearranges the visible, the actions and the ways in which things and beings appear, the usual way of occupying a space, the way of identifying oneself as an individual and of inscribing oneself in relationships. Thus, the scene, taken as a singularity and as an operation of dissensus from which moments of reverie (fabulative daydream) can be produced that fracture consensual imaginaries, alters the way we read, see and hear the other and the world around us. We argue that the scene dismantles predictable explanations, shifting consensus and offering an anti-hierarchical imaginary in which multiple times, spaces and existences coexist.

Keywords:
scene; appearance; fabulation; random moment